terça-feira, 28 de maio de 2013


Surpreendente entrevista com o governador da Bahia Jacques Wagner O Brasil não começou com o PT  

O governador da Bahia afirma que o país vem evoluindo desde o Plano Real, defende a liberdade de imprensa e diz que seu partido deve apoiar Eduardo Campos em 2018

Um problema antigo tem tirado o sono do governador Jaques Wagner: a seca que castiga metade dos municípios da Bahia, que dependem de carros-pipa para matar a sede da população. Embora o Brasil tenha se desenvolvido muito nos últimos vinte anos, diz ele, e não apenas graças ao seu partido, o PT, como admite o drama da seca ainda castiga o Nordeste, só que de forma menos visível.

Quando fala de política, Jaques Wagner se mostra um petista pouco radical: reconhece o resultado do julgamento do mensalão, defende a liberdade de imprensa e se diz favorável até mesmo a que seu partido se comprometa a apoiar a candidatura presidencial de Eduardo Campos, do PSB, em 2018.

O Nordeste passa pela maior seca em setenta anos. Como o governo federal está lidando com isso?

Não há legiões de famintos vagando pelo sertão nem imagens de crianças desnutridas pelas estradas, mas, dependendo da região, a seca é, de fato, a mais severa em noventa anos. Aqui na Bahia açudes de 92 anos secaram pela primeira vez. A dor é a mesma, a consequência econômica é a mesma, a diferença é que hoje há uma rede de proteção social maior, que minimiza o drama da fome.

Infelizmente, não há como zerar o problema. Existe essa rede de proteção social, mas uma eficiente rede de proteção econômica ainda precisa ser consolidada. No último ano, aumentou muito a migração de nordestinos para o Sul e o Sudeste, um fenômeno que praticamente não era mais visto. Não estamos mais como no passado, quando se viam crianças morrendo e famintos pela rua, mas ainda é preciso fazer muito contra a seca.

Outro problema que atinge diretamente a população pobre é a inflação. O fraco desempenho da economia pode pôr em risco a reeleição da presidente?

No início do governo Lula, havia um clamor para que os juros baixassem numa paulada. O Henrique Meirelles (ex-presidente do Banco Central) defendia uma queda mais gradual e, didaticamente, dizia: “A questão dos juros é igual ao aquecedor do chuveiro de casa. A gente liga e tem um tempinho para a água chegar quente à ponta”. Os juros caíram em um ritmo correto e o país voltou a crescer.

Agora é a mesma coisa com o controle da inflação. Tem gente defendendo a ideia de que se dê uma trancada forte nos juros para segurar a inflação. Mais uma vez, acho que a coisa deve ser feita devagar e que, com o tempo, a inflação volta para o centro da meta. Prefiro ficar nesse resultado, de um crescimento que não é exuberante, mas é consistente, a voltar àquele ciclo de altos e baixos que já tivemos.


"Não há legiões de famintos vagando pelo sertão nem imagens de crianças desnutridas pelas estradas, mas, dependendo da região, a seca é, de fato, a mais severa em noventa anos" (Foto: Ricardo Cardoso / Frame)
Há gente em seu partido que defende a tese de que uma inflação acima da meta pode ser tolerada em prol de um crescimento maior. O senhor concorda?

Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso deram uma tremenda contribuição ao incorporar à cultura brasileira o controle da inflação e a parcimônia nos gastos públicos. Foi uma coragem que deu ao Fernando Henrique duas eleições. Disputas políticas à parte, não podemos retroceder, temos de fazer o país avançar, mantendo as conquistas anteriores.

O Lula pegou essa herança e manteve o que era bom para a economia não desandar. Muitas vezes ele é injustiçado ao ser comparado com outros populistas da América Latina, mas jamais aceitou pôr a economia em risco em nome do populismo. Quem escolheu manter o salário mínimo abaixo do prometido em 2003 e 2004 foi ele. Quando houve o mensalão, muita gente falava para ele esculhambar o Orçamento para pacificar a base política. Ele se negou. Por isso tudo, acho injusto pensar que o governo do PT vá abrir mão do controle da inflação.

O governo Dilma tem enfrentado problemas na economia e ainda não conseguiu deixar uma marca. Qual é o símbolo do atual governo?

Fui coordenador do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social e levei dezoito meses para chegar a um consenso: o maior obstáculo ao desenvolvimento eram as desigualdades sociais. Foi unânime, da Febraban ao MST. Lula então aprofundou as políticas sociais. Dilma pegou a economia equilibrada e os avanços sociais e decidiu aumentar a competitividade. O primeiro ponto a enfrentar foi o custo do dinheiro, o que a levou a comprar briga com os bancos. Se o FHC fez o Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal e o Lula investiu no social, a presidente Dilma agora tem de deixar o país mais competitivo.

Mas essa é só uma ponta do problema da competitividade. A carga tributária é excessiva, a infraestrutura está travada…

O país está em evolução, é um grande processo. Não dá para falar que tudo começou com o PT, é uma burrice não reconhecer o que outros fizeram. O alicerce foi feito pelo FHC, muitos tijolos foram colocados pelo Lula e outros estão sendo assentados pela Dilma. O salto dela constitui-se de juros a padrão internacional, energia a um custo mais racional e o gargalo da infraestrutura resolvido.

Como destravar o país?

Há um problema sério nos nossos órgãos de controle. É preciso achar um ponto de equilíbrio entre a velocidade com que o país precisa crescer e a santa necessidade do zelo com o dinheiro público. Zero em um e cem no outro não vale. É muito bem-vindo o controle do dinheiro público, mas ele não pode ser um empecilho ao desenvolvimento.

Mas, mesmo com todo esse controle, a corrupção não retrocedeu.

Eu, sinceramente, acho que o problema melhorou. A corrupção sempre vai existir. Mas já tem muita empresa que não opera mais com caixa dois. Não quero posar de vestal, mas tenho um código. Digo ao empresário que preciso de ajuda na campanha. Aí, aqui no governo, não deixo fazer obras e contratos por mais 1 real, mais 2 reais ou mais 3 reais. Mas, quando chegar de novo a época da campanha, se o empresário foi bem atendido, eu vou pedir uma ajuda. Porque todo mundo faz campanha ajudado. Não há outra forma de fazer a não ser que tenha o financiamento público.

O senhor não acha que há formas melhores de investir o dinheiro do contribuinte?

Pelo contrário, acho que baratearia muito a democracia. O Brasil precisa urgentemente de uma reforma política. Além do financiamento público, sou favorável à coincidência de datas para as eleições de vereador a presidente, com mandato de cinco anos e sem reeleição.

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